segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Depois da Bienal





Visitei mais uma vez os espaços do Santander Cultural e encontrei uma exposição riquíssima, tão bela quanto a própria Bienal: as Estações Pedagógicas. Momento em que público e artista podem trocar, dialogar,... percebendo cada um sua marca.

Trabalhos dos alunos






Exemplos de belos trabalhos de alunos sobre a obra de Macchi. Observe a legenda do trabalho acima: sons das ruas!






Equívoco





Acho válido postar no portfolio esta aparente preocupação com a situação de miséria de parte da população, posto que vem acompanhada de uma visão extremamente equivocada do que vem a ser investimento em educação. Infelizmente, ainda encontramos quem AINDA desconecte exposições com a amplitude da Bienal do fazer pedagógico de sua escola. E o desparate superior sequer merece comentário.




Criando palavras, fazendo arte


Inúmeros trabalhos, como um Dicionário de Palavras Inventadas, estão expostos nesta mesa rodeada de cubos de madeira; um convite para sentar e descobrir muito mais que palavras inventadas, mas todo um novo olhar ao se fazer arte.




Releitura


Detalhe do painel abaixo, destacando um dos tantos trabalhos de releitura sobre a obra de Macchi.
De acordo com o site história da arte - http://www.historiadaarte.com.br/ - releitura é o fazer artístico. Rever qual é a sua atitude com relação à obra e qual a sua reação. É fazer Arte da Arte. É a transformação da crítica em uma atividade artística.

Painel


Em um imenso painel, o resultado de inúmeras propostas de trabalhos sobre a obra de Macchi.


Colours, cores,...


O vidro, presente em algumas das obras de Macchi na Bienal, aqui é o pano de fundo para uma explosão de cores, como se a tinta surgisse do ar...


Caminho


Inspirado na proposta de trazer a arte feita com as próprias mãos para o Santander Cultural, apontei a lente para a escada onde me encontrava e... tive meu instante de artista. Já que Macchi emprestou música aos caos urbano das avenidas, penso que sons ele nos convidaria a ouvir neste caminho em caracol...


A preferência do público da Bienal


Eu já havia comentado em outra postagem que não simpatizara com a decisão da viúva do artista Öyvind Fahlström em proibir que se reproduzissem imagens das obras. Não gosto, quando visito museus de arte, de me deparar com visitantes de máquina em punho, disparando flashes; compromete a obra e é um desrespeito a uma norma que nem precisaria estar afixada por todo lado. Mas daí a não permitir a divulgação de imagens nem no folder oficial da exposição... Resultado: observem em que posição ficou nosso desconhecido artista na preferência dos visitantes. Continuará desconhecido da maioria, como se vê. Prepotência não conquista admiradores. Mas os trabalhos de Fahlström são pura crítica social, uma explícita aula de política local e internacional.


domingo, 25 de novembro de 2007

Como é o jogo na Escola?

A partir do questionamento da disciplina de Lucididade quanto à freqüência dos jogos na minha Escola, escrevi o texto abaixo, igualmente disponibilizado no fórum.
As exceções existem, claro, e quero crer que sejam inúmeras. Mas no tocante ao jogo, persiste a idéia de uma segunda categoria de atividade dentro da escola em uma escala de valores que coloca as tarefas escritas, e que exigem raciocínio lógico-matemático, no topo das abordagens pedagógicas em sala de aula. À idéia de jogo está ligado o professor de Educação Física, cuja essência do trabalho seria, numa análise superficial, simplesmente jogar, ou a menina estagiária, em tenra idade e que ainda tem energia para o corre-corre exigido por atividades puramente lúdicas. Concluindo tal reflexão exdrúluxa, o jogo seria somente para os professores jovens, para as disciplinas consideradas menos importantes que Matemática – e por vezes, exceto pelo ensino da Língua Portuguesa, parece que todas o são – e para aqueles momentos em que todas as crianças se comportaram merecendo, portanto, ter algum tempo para brincar.
Quais são os jogos mais utilizados em minha Escola? Basicamente existem dois tipos de jogos: jogos competitivos e jogos cooperativos. O primeiro visa a conquista de um lugar de destaque, a superação dos limites para a supremacia de um em detrimento de todos os demais, não importando o quanto PERDEDORES tenham se aplicado ao longo do processo e que o VENCEDOR continue sendo, afinal, apenas um ser humano, ainda que com um troféu a ostentar. Os jogos cooperativos tem como essência a inclusão e promoção de todos, respeitando as potencialidades de cada um, enaltecendo as habilidades e trabalhando competências. Percebendo-os desta forma, a mim parece uma cegueira completa insistir nos primeiros, ano após ano, em nossos currículos. E são estes que estão presentes nas gincanas, nas aulas de Educação Física, nas brincadeiras do recreio, assim como nas propostas de jogos levadas pelos professores das diferentes séries para desenvolver entre as quatro paredes da sala de aula os tais jogos.

Tenho tempo de magistério suficiente para usar a expressão “antigamente” ao me reportar a alguma atividade que vira anos atrás... Portanto, antigamente, os jogos eram reservados principalmente para os dias de chuva, quando os alunos ficavam sem seu intervalo, e algumas brincadeiras eram a maneira de recompensá-los pela permanência ininterrupta em sala. O professor menos preparado, rabiscava algumas linhas no quadro e propunha o jogo da forca ou uma sequência de perguntas de temas diversos para determinar um vencedor no jogo conhecido como STOP. Aquele que se propunha a levar algo mais que giz branco, por vezes tinha à disposição alguns jogos de damas, víspora – naquele tempo era assim mesmo que chamávamos ao contemporâneo bingo – ou alguns quebra-cabeças que “encontrara” dentro de algum armário da Supervisão.

Mas ficamos modernos, e o que já era pouco, precário e praticamente nulo em se tratando de relações inter-pessoais e aprendizagem, foi substituído por 29 polegadas de cor, brilho, contraste e matiz, acompanhado de um dvd geralmente pirata com algum filme ou desenho que nenhuma relação tem com a proposta pedagógica da série, do semestre, do mês, da semana ou sequer do dia daquela turma. É a escola ganhando a sua versão da babá eletrônica número 1 das famílias.

As livrarias de qualidade têm fartura em títulos em dvd os quais propõe atividades inúmeras dentro de temas específicos. Mas aí vem a turma do “não temos verba” e ficamos com o filme de correrias de automóveis e/ou lutas sem fim que um aluno trouxe sem sequer consultar a professora se seria adequado.

Jogar com os alunos cansa, exige disposição física e psicológica, mas principalmente envolvimento com o que se faz e com quem se faz. Quanto estamos comprometidos com nossa tarefa e com nossos alunos, jogamos sim, e o fazemos COM eles, jamais observando-os da sala dos professores enquanto correm atrás de uma bola ou saltam sobre uma corda que gira, gira, gira,... cabum, próximo, pois sai o perdedor. O professor que vê no jogo uma ferramenta de aprendizagem, além de optar pela modalidade cooperativa, é também mais um a jogar, não aquele que dita regras para, em seguida, tornar-se expectador.

Faço justiça com alguns colegas que compartilham a Escola comigo e os parabenizo pelas excelentes propostas de atividades lúdicas cooperativas que norteiam sua práxis. Contudo, o cotidiano de uma maioria, e infelizmente na quase totalidade das escolas públicas e municipais, está voltado para o perder ou ganhar, excluir derrotados e enaltecer o mais rápido, o mais ágil, minando pouco a pouco a tão sonhada motivação interior dos alunos.

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Trabalhando com Macchi e Matto



O trabalho com os alunos de 3ª série a partir das obras da 6ª Bienal do Mercosul foi extremamente enriquecedor para o professor e os alunos, tornando ainda mais evidente que todos aprendem e ensinam o tempo todo.

Mas antes de relatar o trabalho, fica aqui meu registro do mais completo repúdio à atitude da viúva do artista Öyvind Fahlström, a qual proibiu qualquer registro fotográfico da obra do artista brasileiro tão pouco conhecido em seu País. Não importam as razões, todas beirando o insensato e a empáfia. O resultado de tamanha anacronismo, em tempos no qual um click de mouse pode tornar alguém conhecido ao redor do planeta, é catapultar Fahlström ao desconhecimento quase completo no Brasil. Sequer o site da Bienal traz imagens de sua obra junto às resenhas acerca de cada exposição monográfica.

Mas voltemos àqueles que permitiram fluir a arte a seu redor...

Foquei meu trabalho nas obras de Francisco Matto e Jorge Macchi. Para tanto, na semana em que desenvolvemos este trabalho, iniciei pela apresentação de um desenho de 20 minutos, gravado do canal Disney (SKY), no qual um personagem de nome Kuzco vivencia descobertas rodeado de pinturas dos povos andinos. Através do Google, cataloguei várias imagens com pinturas dos povos que viveram em Machu Pichu e demais regiões andinas, gravei-as em dvd e apresentei-as. Conversamos sobre as mesmas e percebi que os alunos prontamente estabeleceram uma relação entre o desenho animado, a indumentária do personagem e o ambiente pictórico em sua volta.

O mesmo recurso apresentou aos alunos a obra de Matto. A relação da obra do artista com os traços vistos no desenho foi imediata e unânime. Óbvio que os alunos levantaram a hipótese quanto nacionalidade de Matto: peruana. Falamos um pouco sobre o artista, uruguaio nascido em 1911 e falecido em 1995. Ampliamos os horizontes da pintura pré-colombiana e saímos um pouco de Cusco, a cidade considerada o “umbigo do mundo”, a mais importante do antigo império inca, retornando ao Uruguai e a obra de Matto.

A atividade prática que desenvolvi causou um verdadeiro furor entre os pequenos...

Cada um recebeu um folha A4 com margem, tendo retângulos e quadrados ao longo da mesma. A proposta, resumidamente, era desenhar dentro das formas geométricas cenas do cotidiano, seqüências de linhas, padrões geométricos, ... Enfim, a única “limitação” seriam os pequenos quadrados e retângulos estabelecidos nas margens. O resultado foi belíssimo, rico e curioso. Alunos imaginaram labirintos, planta baixa de residências, álbum de figurinhas e catálogo de produtos, além das cenas do cotidiano e de uma certa influência explícita da obra do artista e dos traços das pinturas incas.

Para trabalhar com Jorge Macchi, optei iniciar com um vídeo da cantora Bjork, no qual ela interpreta o papel de uma contadora de histórias. Contudo, ao abrir do livro, percebe-se que suas páginas estão em branco e que as histórias vão sendo impressas no papel a medida que acontecem no mundo real.

Usando o recurso do dvd, apresentei vários trabalhos de Macchi encontrados via Google, contando também um pouco da biografia do artista argentino. O enfoque foi a obra Speakers Corner, na qual várias aspas de diferentes tamanhos, retiradas de jornais, são expostas lado a lado. A primeira indagação do alunos foi determinante para o sucesso do trabalho que seria proposto: “Aonde estão as frases?” A conclusão dos alunos foi simples e profunda: “Ele retirou as palavras e cada um coloca ali o que quer.” Eu não poderia tecer melhor comentário.

Nosso trabalho prático foi justamente uma interferência na obra de Macchi. Cada grupo de três alunos, no máximo, recebeu novamente uma folha tamanho A4 e folhas de jornais e revistas, previamente selecionadas, trazendo frases entre aspas, de vários tamanhos. Os alunos adoraram a idéia de colar aspas sem as frases na folha A4. Para cada componente do grupo deveria ser colado um par de aspas, apenas retirando a frases entre elas antes de fixá-las no papel.

A idéia era escrever sobre o artista, a Bienal, algo assim; mas os alunos sugeriram que o assunto deveria ser outro (e aprovei a sugestão): a frase seria a resposta para uma pergunta simples. E o questionamento vencedor foi proposto pela aluna Tailini: “O que é arte?” Dentre as frases que os alunos escreveram, destaco as seguintes, tanto pela pureza de seu conteúdo quanto pela idéia que nos trazem desse público infantil que raramente visita um museu, vai a uma bienal, observa a arte nos espaços públicos das cidades, etc.

“Arte é um desenho bonito”.

“A arte é um quadro.”

“Arte é uma idéia em forma de desenho.”

“O que o pintor pensou e pintou no quadro.”

“Uma paisagem que faz a gente se sentir bem.”

“A arte faz a gente pensar.”

Concluo que pecamos ano após ano quando não privilegiamos a arte como espaço de comunicação e expressão para nossos alunos. Por que não existe um programa para as escolas de nosso município com o intuito de levar a arte aos alunos ou estes até os espaços de arte, da mesma forma que se investe em desporto, por exemplo? A arte nos proporciona conhecer melhor nossos alunos e estes a si mesmos, lapidando as relações, qualificando nossa prática educacional cotidiana.

domingo, 11 de novembro de 2007

Jorge Macchi

Nesta primeira postagem de nova visita à 6ª Bienal do Mercosul, destaco o trabalho de Jorge Machi (Buenos Aires, 1963), o qual utiliza-se do vídeo, recortes de jornais, tecidos, plásticos, vidro e outros materiais para projetar mais que apenas imagens, mas o próprio cotidiano de todos nós. O artista criou inúmeros nichos dentro do Santander, inclusive tendo o cuidado de não permitir que a opulência arquitetônica do mesmo provocasse qualquer conflito entre o visitante e seus trabalhos.

Usando a tecnologia mais presente nos lares, o artista constrói pontes entre a tela de inúmeros aparelhos de televisão e nossas próprias histórias de vida. Esta mesma tv que insiste em aprisionar a vida em tantas polegadas quanto o dinheiro pode transportar para nossos lares. O The End, o fim do filme como obra absoluta. O fim de um filme é justamente o que não se vê. O artista justamente parte desta premissa de que não atentamos para o que vem depois do The End e provoca-nos possíveis questionamentos a partir de metáforas: quantos são os roteiros em que estamos envolvidos no cotidiano e que já tiveram seu final não necessariamente feliz e que, por não prestarmos atenção ao que vem após o The End, estamos a encenar infinitamente, certamente ignorantes a algo que estamos fadados a repetir enquanto fecharmos os olhos para a obra completa. Em nossos relacionamentos, tanto pessoais quanto profissionais, quantas etapas concluímos e reiniciamos justamente porque não estamos atentos ao que se passa?

Machi utiliza-se de tecnologia semelhante em outras obras, algumas de um humor tal que nos faz rir da surpresa que provoca, posto que nos propõe sair do óbvio. Que outra reação possível diante do início de uma projeção multimídia, na qual logo após o título da mesma e do nome do seu diretor (o próprio Machi), uma contagem que se supõe decrescente de 10 até 0 simplesmente insiste em jamais chegar ao zero absoluto, brindando-nos com um filme que, afinal, descobrimos ser a própria seqüência númerica?

O travesseiro em uma parede pode remeter a algo efêmero, como as poucas horas de uma noite de sono. A noite passa de forma rápida e nos fala da efemeridade de nossa sociedade e dos novos valores e objetos de desejo que nossa cultura de massa propõe como indispensáveis. A obra nos diz que o tempo de ontem passou, que o momento presente transcorre muito rápido, assim como em outros nichos somos novamente instigados a pensar sobre o estresse das metrópoles, evidente no corre-corre dos automóveis em uma outra projeção de vídeo, acompanhados por sons incidentais de violino e violoncelo – uma experiência visual e auditiva. Notas musicais estão presentes no asfalto e nas paredes de seu nicho com o globo de vidro, transportando-nos através da memória para um período musical que conheceu seu auge na década de 1970, na instigante Still Song, algo como um filme em negativo, onde o escuro é alvo e a luz provoca rasgos negros nas paredes brancas.

Para o artista, a arte contemporânea pode ser simples. Não se faz necessário complicar ou teorizar para compreendê-la. Instigando nossa percepção e imaginação, Machi mantém as aspas de falas anônimas que poderiam certamente ser de todos nós.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Por que você ouve tanta porcaria?



Enquanto lia o artigo da revista Aplauso, percebi que escutava o que, para mim, definitivamente não é porcaria: um álbum de 1987 do grupo britânico Cocteau Twins: Victorialand. A capa já é uma obra de arte, prenúncio da obra-prima que se estende ao longo de nove belíssimas faixas.

Acredito que possa tecer algumas considerações acerca da qualidade de um grupo musical quando, em primeiro lugar, atento para a data de lançamento da música em questão. Observe você que citei um álbum de 20 anos. Penso ser pouco provável que um trabalho musical vazio, sem conteúdo, se sustente por duas décadas nos nossos ouvidos. Óbvio que praticamente ninguém com quem eu converse tenha idéia do que seja este tal Cocteau Twins. A única vez que os ouvi no rádio foi em 1984, altas horas da madrugada, quando o locutor (ninguém dizia DJ na época) anunciou um grupo "diferente". Lembro que fiquei encantado com aquele som etéreo, pois a mim parecia que do paraíso haviam escapado notas sublimes, sublinhando uma voz única, que realmente não tem paralelo no meio musical, da vocalista Elisabeth Fraser.

No texto da revista Aplauso comenta-se que treinamos o ouvido desde crianças. Se a intenção do autor foi decretar que estamos fadados ao mesmo gosto musical por toda a nossa existência, discordo por completo, pois seria negar a mutabilidade inerente ao ser humano. Um pouco de história... a minha história, para justificar o porquê de minha afirmação.

Até 1984, eu comprava basicamente discos (ainda em vinil) com trilhas de novela. Depois de muitos álbuns e inúmeras novelas, começou a soar tudo igual. Lembro bem que não mais me sentia satisfeito com as músicas que vinham gravadas ao longo das 12 faixas ou mais de cada álbum.

Um dia, pintava as paredes de meu quarto e ouvia a rádio Ipanema FM, que era muito melhor do que se tornou, e que de alguma forma trazia músicas que eu estava buscando, ou seja, artistas fora do esquema das novelas. Aí tocou uma banda chamada The Jesus and Mary Chain. As notas musicais eram paupérrimas, acho que só uma variação de três ou quatro. Mas havia tanta alma naquelas poucas notas, nas guitarras distorcidas, no vocal soturno, sombrio e quase doce, que antes da música terminar eu já havia largado o pincel, limpado as mãos e me propunha a sair correndo para Porto Alegre e comprar o disco do artista. Bastou ouvir o nome, fui até a Galeria Chaves, numa loja que não existe mais – Pop Som – e voltei de lá com um álbum celebradíssimo um mês depois da revista Bizz, publicação que eu passei a acompanhar naquele tempo. Lembro de uma frase do crítico, o qual babava pelo grupo: “a arte quer morrer!” Isso me pareceu tão forte, contundente. Hoje entendo que ele se referia à subversão ao modismo, pois cada faixa do álbum era uma espiada em algum recanto escuro da alma do ouvinte, não uma celebração à bundas, peitos e congêrenes de apelo popular de venda certa. Até hoje é um de meus álbuns favoritos, que obviamente comprei anos depois em cd, aliás importado, pois aqui não houve interesse por parte de gravadora alguma em distribuí-lo quando os cds começaram a circular em lugar do disco de vinil.

Falando em importados...

Acho que 90% dos cerca de 800 cds que formam minha coleção vieram de fora. Não que o dinheiro estivesse ou esteja sobrando, bem pelo contrário. Mas experimente você gostar de algo que não é comum em tempos que não havia internet (ainda que nessa área pouco tenha mudado quando se trata de acesso à determinadas obras). Por isso, acabei desenvolvendo um gosto que se diferenciou da maioria mas que, óbvio, encontra seus pares aqui e ali, pois o artista só existe porque existe quem aprecia seu trabalho. Aliás, a internet, com suas lojas virtuais, pelas quais é possível adquirir praticamente tudo de qualquer lugar do mundo, tirou completamente o sabor que existia em ir até algumas poucas lojas de Porto Alegre que se especializaram em cds importados. Tomava-se em mãos catálogos que pareciam listas telefônicas e, para desespero e/ou alegria nossa, os fãs, deparava-se com inúmeros títulos dos artistas favoritos que jamais sairiam aqui. Boa parte da minha coleção do citado Cocteau Twins assim foi adquirida. Atualmente, faço minhas compras pela Internet, procurando valores coerentes e recebendo em prazos menores do que outrora, pois a espera geralmente beirava três semanas.

Mas o assunto é música, não compras.

Na minha primeira postagem no fórum procurei não citar este ou aquele estilo ou artista e separar o que para mim é o joio do trigo. Penso que a música é um exercício de democracia. As pessoas não podem ser obrigadas a gostar de algo (ainda que pareçam subliminarmente ser) e verem-se ridicularizadas ao assumir que ouvem este ou aquele artista considerado de menor valor. Quem tece tais considerações afinal? A música que provocou uma virada no meu gosto musical tinha apenas três notas. E dizer que o povo escuta esta ou aquela música porque não entende o significado de letras de artistas mais “completos” é esquecer que o povo escuta aquilo que é colocado no rádio e na tv para que ele consuma, sem reflexão mais profunda. Não acredito que um pagodeiro ou fã de música sertaneja não se comova com a letra de “Chega de Saudade”. Um pedacinho: “Vai minha tristeza e diga a ela que sem ela não pode ser. Diz-lhe numa prece que ela regresse, porque não posso posso mais sofrer.” E olha que se trata de um dos mais belos exemplos de nossa bossa nova, celebrada ao redor do mundo, mesmo por quem não compreende uma única palavra do que é cantado, em função das diferenças de idioma, não de classe social. Aliás, é da música esta capacidade de transpor as “barreiras” da língua, das culturas, das classes,... Uma obra musical é como uma pintura: seu autor pode estar no outro lado do globo, mas seu trabalho te toca de forma profunda, te fazendo desejar ter em sua casa aquele trabalho. Nossa discoteca particular, ou as músicas que acumulamos na memória ao longo dos anos, são como álbuns de fotografias, visto que também contam muito de nossa história.

Em sala de aula temos, como educadores, a oportunidade de celebrar a democracia que é a música. Trazer para a escola apenas o que nós acreditamos ser a boa música é assumir uma postura semelhante a da indústria fonográfica, que direciona toda uma massa de acordo com seus objetivos. Que tenha espaço entre nós vários nomes, inúmeros artistas e incontáveis estilos. Indispensável contextualizá-los, ou estaremos promovendo simplesmente uma imensa salada, tão grande a mistura que pode ficar com um sabor enjoativo.

E se você deseja dar um presente a seus ouvidos e oportunizar também a seus alunos ouvir algo diferente, aqui vai a ponta do iceberg de meus grupos favoritos (e que podem soar uma porcaria para muita gente; viva a democracia musical!):

  • Cocteau Twins
  • Dead Can Dance
  • This Mortal Coil
  • His Name Is Alive
  • Bjork
  • The Sugarcubes
  • Sigur Ros
  • Enya
  • João Gilberto
  • Marisa Monte





segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Jogos Cooperativos


Esta semana iniciei participando de um oficina de jogos cooperativos. Ao contrário dos jogos competitivos, os quais sempre objetivam eliminar adversários, estes reservam espaço para todos, respeitando as diferenças inerentes a cada ser humano.

A certa altura do encontro, promovido pela SMED de Gravataí, senti-me tão à vontade (reflexo da própria cooperação) que pedi o microfone e coloquei-me a refletir em voz alta:

"Em nossa sociedade temos tanto a competição quanto a cooperação e não estamos aqui para enaltecer a segunda expurgando a primeira, pois seria um mero exercício de retórica. Acredito que devamos pensar que há diferenças sutis entre atividades competitivas e cooperativas. Parece-me que faz parte da competição que os fins justifiquem os meios, pois sob a égide de um ambiente competitivo importa o produto final, e este deve ser o melhor possível, de qualidade, superando a tudo que já tenha sido pensado anteriormente. Num ambiente de cooperação, a qualidade está nas relações de trabalho, no processo de criação de um produto (ou jogo, atividade, diálogo, etc), assim como no artigo final. Entretanto, aqui os fins somente justificam os meios se estes forem éticos e inclusivos. Num processo cooperativo não há espaço para a exclusão."

Enfim, uma oficina de jogos provocou-me uma gama de reflexões acerca da inclusão de todos a meu redor em uma sala de aula. Quais os momentos em uma sala de aula que estão a estigmatizar alunos ou, pelo contrário, a promovê-los por meio do seu melhor? A ludicidade no cotidiano, usando de jogos cooperativos, certamente tornará mais evidente que existe espaço para todos entre quatro paredes de uma sala de aula formal.

quarta-feira, 31 de outubro de 2007

O Teatro na Escola




A proposta de levarmos para nossas turmas o trabalho de teatro que vivenciamos em nossa aula presencial acabou tornando-se uma verdadeira fonte para reflexões. Tendo como objetivos os três listados abaixo, percebi que obtivemos - professor e alunos - muito mais do que iniciando era desejado.
Objetivos a que eu havia me proposto com o trabalho:

1. Trabalhar com os alunos a exploração espacial, o respeito pelo espaço alheio e a comunhão deste mesmo espaço.

2. Estimular a atenção para diferentes sons, não necessariamente comuns no cotidiano, respondendo a estes por meio de simulação de uma situação (foto ou estátua), lidando com diferentes níveis e direções ao deslocar o corpo pela sala de aula.

3. Dramatizar situações do dia-a-dia familiar por meio da técnica da fotografia e da narração da situação durante a transição de diferentes cenas.
A excitação dos alunos, sinalizada pelas gargalhadas excessivas, quase ruidosas, não chegou a ser um problema. Pelo contrário, pareceu-me assim que atestavam o quanto estavam se divertindo. Ainda que não seja um objetivo explícito, meu desejo era o de que, acima de tudo, os alunos experimentassem prazer em desenvolver as atividades.
Quando os alunos perceberam que o objetivo da proposta do "álbum" era construir boas cenas, a melhor possível, sem para isso ocupar lugar de destaque em detrimento de outros grupos, a atmosfera de comunhão fez-se totalmente presente no trabalho. Refletimos em conjunto que não precisamos estar competindo o tempo todo em todas as tarefas e veio de um aluno a conclusão que "contribuir é o melhor para todos nós."
As atividades desenvolvidas, descritas em meu webfolio, reconhecem no teatro, ainda que momentaneamente, seu papel único na formação dos indivíduos, com um fim em si mesmo e não como ferramenta para o entendimento e conteúdos desenvolvidos em outras disciplinas. Segundo Cleusa Jocélia Machado, professora de Artes Cênicas do Colégio de Aplicação da UFRJ, não importa, visto por este prisma, "se o aluno é ou não um artista ou determinar o valor artístico da criação em sala de aula." Os exercícios propostos, os jogos dramáticos e as atividades que envolvem o corpo criam uma nova realidade, assumindo o estudante um outro espaço que não o da vida cotidiana e, até mesmo, um outro papel neste espaço.

A expressão de uma idéia é o próprio texto no teatro, aqui entendido não apenas como uma sucessão de fala articulada, mas de uma intenção que é transmitida, a qual pode vir através de um som, um gesto, uma postura, além da palavra.

O teatro ainda está longe de ser uma disciplina na grande maioria das escolas. Ele ainda aparece, quando muito, atrelado aos assuntos de um componente curricular ou evidenciado como ferramenta lúdica para a evocação de ideais nacionalistas, notadamente nas horas cívicas.
Assim, no contexto escolar, podemos encontrar o teatro nas seguintes situações:
1. O teatro sendo utilizado como meio para o entendimento de um determinado conteúdo de disciplinas do currículo;
2. Em apresentações que se desenvolvem a partir de jogos criativos e de práticas de improvização;
3. No jogo dramático, quando se pretende uma prática lúdica tanto individual quanto em grupo, sem a necessidade de platéia, mas principalmente para a "apropriação dos mecanismos fundamentais do teatro", conforme Ana Carolina Müller Fuchs;
4. Nos jogos teatrais, por meio dos quais se traz para o plano físico o que habita o terreno das intenções, dos sentimentos, das sensações e pensamentos. Este método "inclui jogos que propõem um desafio a ser resolvido e que inclui a relação entre quem improvisa e quem assiste."
Isso me faz questionar: por que se faz tão pouco teatro nas escolas? Se os resultados positivos são visíveis no semblante dos alunos (vide fotos acima), qual a razão para a exclusão quase total do teatro em nosso COTIDIANO?
Entendo que o teatro tem um papel singular na formação do indivíduo e que negá-lo ao aluno acarrete em um equívoco impossível de ser reparado, exceto pelo próprio teatro.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Vincent Van Gogh e as crianças




O questionamento proposto no fórum de artes visuais moveu-me a postar uma atividade pregressa, aqui no portfolio.

O questionamento: quais os desafios que o professor encontra no ensino de artes? São desafios tanto materiais quanto humanos. A carência de material é óbvia, mas a ausência de vontade de fazer um bom trabalho não é rara. Dado que bons e maus profissionais teremos sempre e em todas as esferas do serviço público e privado, resta a cada um decidir de que lado quer ficar. Feita a opção pelo time que busca estabelecer objetivos e produzir conhecimento COM os alunos POR MEIO do trabalho de artes, procura-se dar um "chega pra lá" também na justificativa de que "nada faço porque não tenho o material que preciso". O "material" mais rico é o professor. Coloque um professor obtuso ou desestimulado em uma sala ambiente toda voltada para artes na melhor escola e o resultado será inferior ao daquele alcançado por seu colega em uma outra escola, sem um quarto destes materiais, mas que promove um olhar curioso por parte de seus alunos ao mundo que nos cerca. Dificuldades para que eu, Paulo, trabalhe com artes? Se me permitir contaminar com toda a espécie de "razões" para insistir na folha mimeografada para pintar, EMPRESTADA pela colega de série, estarei frente a maior das dificuldades: meu senso de valor limitado em relação a meu papel enquanto educador.


Um trabalho que muito gostei de fazer com uma turma de 4ª série, ainda em 2005, foi sobre a vida de Van Gogh. O início: os alunos levaram para casa um material impresso com uma pequena biografia do artista. Durante o final de semana tinham apenas duas tarefas com este material: lê-lo e destacar um fato que chamasse a atenção. Recordo os mais destacados: o fato de Van Gogh não ter seu trabalho valorizado ainda em vida. Sua depressão e demais problemas psicológicos. E algo inusitado de ser destacado: ser um homem muito feio. Coisa de criança mesmo (risos). Os alunos pensavam que todo artista certamente pertenceria ao topo da pirâmide social, todos se tornam celebridades com verdadeiras hordas de fãs a venerá-los e que são incontestavelmente felizes, com auto-estima irretocável 24 horas do dia. Após tal discussão, vimos parte do filme SONHOS, de Akira Kurosawa. Por que parte do filme? Para quem já o assistiu, sabe que a obra é dividida em episódios (os sonhos do título), e que um deles traz Van Gogh e sua obra como pano de fundo.

Os alunos encantaram-se como Akira Kurosawa transformava paisagens em quadros do artista, tanto quanto sentiram-se mais apropriados da história do pintor e de suas motivações para pintar suas telas. Já em sala de aula, cada aluno recebeu uma pequena reprodução de Noite Estrelada e uma outra com O Quarto. Foi identificação total: o quarto humilde aproximou-os do holandês que não era, como eles, celebridade em seu tempo. O céu noturno repleto de estrelas representava quase que um hobby que muitos deles relataram: ficar olhando estrelas à noite (lembro que, naquele momento, tive a certeza de que vivia um momento mágico com meus alunos poetas). Os alunos fizeram, então, uma interferência na obra de sua escolha. Lembro que uma imensa lua à direita da tela ganhou a forma de um ovo estrelado nas mãos de um dos pequenos. Outro, ousou ver nas árvores à esquerda um foguete pronto para ganhar os ares.

Enfim, fizemos uma exposição dos trabalhos no saguão da Escola. Ao lado da obra de cada aluno, a miniatura com a obra do pintor holandês Vincent Van Gogh. Já em 2007, é o professor daqueles alunos que faz semelhante interferência na obra de Velásquez, como tarefa da Artes Visuais.

Para concluir, uma evidência que salta aos olhos: definitivamente, nossos alunos são avessos à mediocridade.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Contos de fadas


O trabalho sobre elementos da narrativa a partir do conto Cinderela motivou-me a buscar mais informações quanto a sua origem. Cheguei ao francês Charles Perraut. Este escritor, que tornou conhecida ao redor do mundo a história da órfã hostilizada pela madrasta e que descobre a felicidade ao calçar seus sapatinhos de cristal, presentes de sua fada-madrinha, também é o autor de outros tantos contos belíssimos, mas bem menos populares.

Dentre estes, escolhi justamente um conto intitulado "As Fadas" para uma roda de histórias com alunos de 4ª série. Com exemplar simplicidade, mas longe de ser superficial, Perrault descreve o valor da gratuidade das boas ações. Ele nos relata como duas irmãs, ao vivenciarem uma mesma experiência, tomam decisões distintas, que resultam em destinos completamente diferentes. A primeira irmã, de boa índole, sacia de bom grado a sede de uma humilde senhora que passava próximo a uma fonte em uma floresta. Ao perceber que o bem faz morada no coração da menina, esta senhora - na verdade uma fada - concede-lhe um dom. Por meio deste dom, da boca da menina sairiam flores e pedras preciosas quando esta falasse. Ao chegar em casa, sua gananciosa mãe sinalizou a outra irmã, cuja bondade não cultivava, que fosse até a fonte e desse de beber a uma pobre senhora que por lá passasse. Chegando ao local, eis que vê saindo da floresta uma senhora magnificamente vestida. Esta lhe pede um pouco de água, recebendo em retorno descaso e escárnio. Como a menina pareceu-lhe rude e pouco prestativa, concedeu-lhe igualmente um "dom", este porém um tanto diferente: ao falar, da boca da menina sairiam cobras e lagartos.

Uma belíssima conclusão dos alunos é que uma boa ação só pode ser assim denominada quando não há qualquer interesse por detrás do gesto praticado. Uma segunda análise feita diz respeito às
cobras e lagartos que saíam da boca da menina grosseira, visto que lembraram desta expressão, usada para definir o modo pouco educado de alguém se dirigir a outras pessoas. Por sugestão de uma aluna, listamos o nome de todos os contos que eles conheciam nos quais conta a figura de uma fada. Foram citados:
  1. Rapunzel
  2. A Bela Adormecida
  3. Peter Pan
  4. A Bela e a Fera
Os alunos fizeram, ainda, uma atualização das fadas dos contos acima mencionados. O casal de fadas Cosmo e Wanda, do atualíssimo desenho animado Os Padrinhos Mágicos é querido por todos eles, sem qualquer exceção.

Percebi, com esta simples atividade, o quanto uma boa história pode movimentar uma turma em torno de um tema.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

As Meninas



Na obra de Diego Velásquez - As Meninas - residem mistérios, dentre eles: o que estaria o pintor retratando na imensa tela em sua frente, à esquerda da pintura? Velásquez por vezes retratava a si mesmo em seus trabalhos, e era comum para o artista espanhol criar uma obra dentro de outra obra. Provocado pela disciplina de Artes Visuais, resolvi "desvendar" o que estaria Velásquez pintando. Criei eu próprio a tela.

Como acredito que neste quadro o artista estaria pintando o casal refletido no espelho na parede ao fundo, coloquei uma mulher ao lado de Velásquez, esta com o rosto da infanta já retratada na cena do ateliê. O rosto de Velásquez e da menina foram impressos, recortados e colados sobre o meu próprio trabalho. Em minha pintura, retratei a Velásquez com vestes azuis, cruz semelhante àquelas usadas pelos navegadores portugueses bordada no peito, ainda que ele seja natural de Sevilha, Espanha, tendo um céu com azul intenso e muitas nuvens às suas costas. Com uma estatura menor, retratei a mulher à frente de uma viçosa árvore, em plena abundância de frutos, numa analogia à possibilidade do corpo feminino gerar vida. A semelhança entre a peruca da mulher e as nuvens por detrás de Velásquez resultaram uma feliz coincidência.

Originalmente postado no meu blog pessoal em 30 de setembro: http://paulomedeiros1967.blogspot.com/

Reflexão



Todos já ouvimos alguém a dizer que uma pessoa é do tamanho de seus sonhos. Penso no quão pequeno se sente o indivíduo que não acalenta qualquer perspectiva de vida, não planeja nem, portanto, almeja qualquer novo movimento em seu cotidiano presente e futuro. Aqueles que não têm aspirações, apenas se deixam levar por mais um dia e uma noite que a este segue, num ciclo natural sem fim.
A disciplina de Ludicidade e Educação convida-nos a pensar acerca de nossos sonhos, perguntando: teria eu um sonho para sonhar? Como pretendo atingí-lo? Em meu cotidiano profissional, o que faço para fomentar a emergência dos sonhos de meus alunos?
Há aqueles que se reservam o direito de não falar a respeito de seus projetos, pois acreditam que isso comprometeria sua realização. Em outras palavras, temem o chamado “olho gordo”. Particularmente, não me detenho a analisar se o dito “olho” realmente existe, mas penso que quando algo tão desejado não se contempla, é menos em função de uma energia alheia do que por irresponsabilidade de quem não acreditou em sua própria capacidade para chegar aonde almejava. Quando ouvimos de alguém que algo é “muita areia para seu caminhão” estamos diante de alguém que, além de repetir ditos populares, carrega consigo uma flagrante baixa auto-estima. Quem determina o limite de cada um em sua caminhada rumo aos sonhos não é mais ninguém do que aquele que sonha, seja este um sonho pequeno ou grande.
Uma verdade inquestionável é que estamos sempre certos quando nossa reflexão aponta para o que acreditamos ser possível; ao acreditarmos que podemos ou não fazer e/ou ser algo que desejamos estamos totalmente corretos. Em outras palavras, acredito que o otimismo nada mais é do que uma torrente de energia mental, espiritual e amorosa para conosco a nos impulsionar enquanto o pessimismo nos acorrenta ao lugar no qual desejaríamos não permanecer. O atleta para-olímpico, que apesar de todas as dificuldades que a ausência de visão, membros ou harmoniosa função neurológica impõem, supera-as uma a uma e sente o calor da medalha no peito é alguém que não se permitiu acorrentar. A mãe que consegue educar seus filhos conforme padrões éticos, morais e religiosos, sozinha e com um salário longe de ser digno é tanto uma otimista quanto uma vencedora. A educadora, esposa e mãe que, após uma jornada de 40 horas ou mais ainda se dedica com afinco às atividades em uma Universidade que julgava tão distante está longe de ser alguém que esmorece diante das dificuldades, próprias do caminho daquele que agarra as rédeas de seu futuro com as duas mãos.
Assim, neste dia do professor, reflitamos com sinceridade e sem pudor: o que nos move dia-a-dia em nosso fazer pedagógico? Que certezas alimentamos em nosso íntimo e no coração de nossos alunos? Qual a extensão de nossos sonhos? Por que permanecemos educadores?

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Arte na Escola - Fotografia




Trabalhei nesta noite de quarta-feira, 10 de outubro, com fotografias de Sebastião Salgado. Os alunos destacaram temas em comum nas 10 imagens selecionadas da série Êxodos: etnias, raízes, busca da felicidade, desigualdades e solidão.
Extremamente gratificante ouví-los discutindo acerca da beleza contida em imagens com temas originalmente tão tristes. Destacaram a escolha do fotógrafo pela técnica de preto e branco, dos temas sociais e do cunho jornalístico de seu trabalho.
Ficou para casa a tarefa: trazer uma fotografia de mídia impressa a qual retrate tema semelhante ao da série do fotógrafo brasileiro. Colar a foto em papel branco, criando uma galeria de imagens com os demais colegas no saguão da Escola.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Artes Visuais - Cultura Visual



Na temática 4, sobre cultura visual, nos são apresentadas três imagens retratando uma mesma instituição – a família – inseridas em contextos distintos.

Acima, a primeira obra (IMAGEM 1) é de Fernando Botero, pintor colombiano nascido em 1932, caracterizada por figuras rotundas.

Botero parece evidenciar no traço de sua pintura a ganância e a imobilidade da sociedade atual, a qual visa acumular, ter sempre mais, buscando tal relação na evidente gula dos membros da família retratada. Sua obra sempre é uma sátira às instituições e a família não seria poupada de seu olhar ácido e crítico. A respeito de sua obra, afirma: “Não sou cubista, impressionista, surrealista ou expressionista. Sou o que sou.” Para o artista, uma obra pode refletir um tom dramático ou amável sem perder o interesse estético.

A imagem 2 ilustra o trabalho de Mestre Vitalino. “Família de retirantes” retrata a dura realidade do sertanejo, em uma explícita oposição à fartura da família de Botero. Mestre Vitalino nasceu Vitalino Pereira dos Santos, em Caruaru, Pernambuco, em 1909, filho de pai lavrador e mãe artesã. Em sua obra, Vitalino representava o mundo em que vivia, tornando-se o maior ceramista popular do Brasil.

Certamente, a imagem de publicidade, terceira e última, aproxima-se da família de Botero, no que diz respeito à alguma estabilidade material. A “família perfeita”, constantemente presente em comerciais de margarina, também faz suas incursões em propagandas de remédios, alardeando que a “zelosa mãe” usaria aquele produto, ou que compraria tal marca de cereais para a família “começar bem o dia”. Entretanto, a proximidade com Botero cessa nos sorrisos, pois enquanto o artista faz uma crítica, a peça publicitária visa tão somente vender um artigo de consumo. Indispensável frisar que todo e qualquer artigo veiculado através da “família perfeita” dos outdoors e comerciais de tv, passam bem longe dos caminhos tórridos percorridos pela “família de retirantes” de Mestre Vitalino.


sexta-feira, 5 de outubro de 2007

O corpo como escultura






























Após nosso encontro de Teatro na Educação e ainda ENCANTADO com a magnífica proposta de Artes Visuais, resolvi unir as duas propostas e desenvolver um trabalho com os professores de minha Escola, visto que estou trabalhando como supervisor em um turno. Levei fotos de Sebastião Salgado, obras de Portinari, Tarsila, etc, e as exibi por meio de um data-show. Nas obras, um tema em comum: o cotidiano dos menos favorecidos socialmente. Antes, mas na mesma tarde, havia desenvolvido com os professores a técnica da fotografia, de nossa aula de Teatro.

Resultou assim a seguinte proposta: representar por meio de esculturas vivas duas cenas. Uma na escola, outra na família, nos diferentes grupos em que os professores foram reunidos.

Acima, pode-se ver tanto as cenas quanto os títulos que os autores deram às obras:

TOPO, À ESQUERDA: Nunca estamos sozinhos.

TOPO, À DIREITA: A família - base sólida para a criança avançar

CENTRO, À ESQUERDA: Contação de histórias

CENTRO, À DIREITA: Família sem norte

BASE, À ESQUERDA: Sem diálogo na sala

BASE, À DIREITA: Mãe zelosa

Evidências e argumentações



A interdisciplina Seminário Integrador III propõe o filme Doze Homens e Uma Sentença para que possamos contruir coletivamente conceitos de evidência e argumentação, postando-os no fórum e, posteriormente, em um único trabalho a partir da fala de todos os integrantes de nosso grupo, de número 6.

Primeiro de tudo, gostaria de salientar que o título que foi dado ao filme no Brasil não corresponde ao título original de mesmo: Twelve Angry Men. Uma tradução bem mais próxima seria "Doze Homens Furiosos".

Ainda que eu prefira o título dado no Brasil, entender o original nos dá pistas importantes para compreender o comportamento dos jurados durante seus trabalhos.
Praticamente a totalidade do júri estava contrariada com o fato de precisar permanecer naquela sala modorrenta, sem ar-condicionado (que já existia na época), a fim de julgar um caso que lhes parecia resolvido. A insistência de um único homem em trazer à luz do diálogo responsável as ditas evidências daquele crime, oportunizando argumentações tais que corroborassem ou não as mesmas, mostrou-se suficiente para que os humores se alterassem. Ao longo do filme, assistimos a um desfile de cólera, ressentimentos, frustrações e toda a sorte de questões mal resolvidas que poderiam desencadear na condenação de um suposto assassino à pena capital.

Ao mesmo tempo, o diretor deixa algumas questões para o espectador refletir:


1. Quais os critérios que permitiram a escolha daqueles jurados? Dado que um queria apenas contar histórias para passar o tempo, dois entretinham-se com passatempos em uma folha, outro fazia marketing de seus produtos, sem esquecer um que só pensava em sair para assistir ao "grande jogo", isso evidencia uma certa falta de cuidado na seleção dos mesmos.


2. Nenhuma mulher fazia parte dos membros do júri, nem mesmo entre os suplentes. Seria naquela época vetado às mulheres participar como juradas nos tribunais dos Estados Unidos da América?


Pois nas mãos dessa "pérola" de júri se encontrava a vida de um rapaz de dezoito anos, o qual teria contra sua pessoa uma seqüência de evidências que o incriminariam segundo a ótica da maioria dos presentes da haver matado o próprio pai. Dentre as evidências apontadas por diferentes jurados, destaco:

a) "Não é segredo que crianças vindas da miséria são uma ameaça para a sociedade." A fala aqui transcrita argumenta que existe uma relação evidente entre origem humilde e criminalidade. Tal argumentação encontra eco em um segundo jurado, que acredita existir nas pessoas pobres uma propensão a cometer crimes. Diante de tais argumentações, ouve-se uma afirmação contundente: "O preconceito sempre obscurece a verdade."


b) A razão que teria provocado no rapaz tal ato de violência resultando em um crime, teria sido uma briga com seu pai, que o esbofeteara naquela noite. Para Davis, o personagem de Henry Fonda, é imprescindível lembrar que o acusado "nasceu na pobreza, sua mãe morrera quando ele tinha 9 anos, morou um ano e meio em um orfanato, enquanto o pai estava preso por estelionato". Davis argumentava que dezoito anos de sofrimento ininterrupto teriam praticamente "anestesiado" o acusado contra as agressões do seu pai e que aquele seria apenas mais um episódio de violência contra sua pessoa. Mas o próprio Davis conclui que, para a promotoria, este seria um argumento muito frágil em favor do acusado.


c) Uma terceira evidência foram os sons ouvidos por um vizinho, visto que alguém gritara "eu vou te matar" no apartamento acima ao dele. Davis argumenta que as paredes e o piso que separam os andares não permitem a distinção exata do que se escuta.

d) Para a promotoria, uma evidência inquestionável era a faca encontrada e que seria a arma do crime. Sabiam que o acusado tinha uma faca igual e que a mesma, argumentou-se, era rara, sendo improvável haver outra igual nas proximidades. Davis continua a desconstruir as argumentações da promotoria e dos demais jurados tirando de seu próprio bolso uma faca idêntica, relatando que a havia adquirido em uma loja local, na qual haveria outras disponíveis.


e) Ainda no campo das argumentações, a direção do corte no peito da vítima, de cima para baixo, não poderia ter sido desferida pelo acusado, em razão de sua estatura menor e do modelo de faca utilizado para o crime, que exigia uma empunhadura distinta.


f) Uma evidência dita inabalável era o testemunho de uma senhora. Esta afirmava ter visto o rapaz matando o pai a partir da janela de seu quarto, o qual ficava exatamente à janela do apartamento em que ocorrera o assassinato. Ela se encontrava dormindo. Acordara, aprumando-se em sua cama (à altura da janela) e vira a cena relatada. Contudo, Davis atenta que a mulher tinha o nariz marcado pelo uso de óculos, tal qual um dos jurados. Para ele, o fato dela precisar de óculos para corrigir sua falta de visão e, obviamente, não estar dormindo com os mesmos, rechaça seu testemunho. Sua argumentação baseia-se ainda no fato da presença desta testemunha sem os óculos durate seu depoimento, o que poderia ser fruto de uma instrução prévia da promotoria, que ocultara ser necessário à testemunha o uso de lentes para bem visualizar toda e qualquer situação em seu redor.

O ápice da obra é justamente quando o número de jurados em favor da condenação do rapaz se inverte, passando de onze para um. O último a resistir em mudar seu voto o faz, como fica claro, por estar magoado com seu próprio filho, também jovem, que desaparecera depois de dar-lhe (no pai) um murro no seu queixo durante um desentendimento entre os dois. Percebendo que estava usando o acusado do crime para julgar a atitude de seu filho, certamente para vingar-se em função da dor que sentia, muda seu voto nos minutos finais.

sábado, 29 de setembro de 2007

Visitando a 6ª Bienal do Mercosul


A 6ª edição da Bienal do Mercosul reúne 250 obras de 67 artistas. Conta também com três exposições individuais, as quais destacam os trabalhos do brasileiro Oyvind Fahlstrom, do argentino Jorge Macchi e do uruguaio Francisco Matto.


Três Grandes Mostras


A Bienal conta com três grandes mostras - "Conversas", "Zona Franca" e "Três Fronteiras". Nestas, podemos conferir o trabalho de artistas de vários países, sul-americanos em sua maioria.


Evento importante


O evento é considerado um dos mais importantes das artes plásticas na América Latina e inebria Porto Alegre com arte durante quase 80 dias, visto que se iniciou em 1º de setembro as exposições e estas ficarão abertas ao público até 18 de novembro, diariamente das 9 às 21 horas.
Foto: Meu arquivo pessoal - Santander Cultural ao entardecer

Os três artistas convidados

Segundo o curador da Bienal neste ano, o espanhol Gabriel Pérez-Barreiro, os três artistas convidados para as exposições individuais são contemporâneos e têm forte influência do modernismo e da década de 1960 em seus trabalhos.

“Fahlstrom (São Paulo, 1929 - Estocolmo, 1976), o único artista brasileiro homenageado com exposições monográficas no Museu de Arte Moderna de Nova York, no Centro Georges Pompidou (Paris) e na Moderna Museet de Estocolmo, terá em Porto Alegre sua primeira mostra particular no Brasil.”


“Macchi (Buenos Aires, 1963), um dos artistas contemporâneos mais reconhecidos da Argentina, trabalha com objetos cotidianos adaptados a instalações, vídeos e fotografias, entre outros meios de arte.”

“Matto (Montevidéu, 1911-1995), com um trabalho que revela seu interesse pelas culturas pré-colombinas, é considerado um artista que harmoniza muito bem as artes antigas e as linguagens contemporâneas.”

(Fonte: Revista da Semana – Editora Abril)

O modernismo


Dado que os três artistas homenageados sofreram influência do modernismo em seus trabalhos, cabe aqui uma certa luz sobre o significado deste período na história da arte.
O modernismo surgiu na última década do século XIX, na Europa, valorizando a arte e sua forma de criação – manual – em plena revolução industrial. Na pintura modernista, a idealização da mulher manifestou-se através de figuras que lembravam tanto ninfas quanto anjos, de corpos quase etéreos. Numa atmosfera quase translúcida, a natureza assumiu formas onduladas, de bosques aquáticos e longos ramos. Entretanto, o “ousado erotismo transformou-se em pouco tempo no paradigma indiscutível da pintura modernista.”
Foto e trecho entre aspas: www.historianet.com.br