sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Evidências e argumentações



A interdisciplina Seminário Integrador III propõe o filme Doze Homens e Uma Sentença para que possamos contruir coletivamente conceitos de evidência e argumentação, postando-os no fórum e, posteriormente, em um único trabalho a partir da fala de todos os integrantes de nosso grupo, de número 6.

Primeiro de tudo, gostaria de salientar que o título que foi dado ao filme no Brasil não corresponde ao título original de mesmo: Twelve Angry Men. Uma tradução bem mais próxima seria "Doze Homens Furiosos".

Ainda que eu prefira o título dado no Brasil, entender o original nos dá pistas importantes para compreender o comportamento dos jurados durante seus trabalhos.
Praticamente a totalidade do júri estava contrariada com o fato de precisar permanecer naquela sala modorrenta, sem ar-condicionado (que já existia na época), a fim de julgar um caso que lhes parecia resolvido. A insistência de um único homem em trazer à luz do diálogo responsável as ditas evidências daquele crime, oportunizando argumentações tais que corroborassem ou não as mesmas, mostrou-se suficiente para que os humores se alterassem. Ao longo do filme, assistimos a um desfile de cólera, ressentimentos, frustrações e toda a sorte de questões mal resolvidas que poderiam desencadear na condenação de um suposto assassino à pena capital.

Ao mesmo tempo, o diretor deixa algumas questões para o espectador refletir:


1. Quais os critérios que permitiram a escolha daqueles jurados? Dado que um queria apenas contar histórias para passar o tempo, dois entretinham-se com passatempos em uma folha, outro fazia marketing de seus produtos, sem esquecer um que só pensava em sair para assistir ao "grande jogo", isso evidencia uma certa falta de cuidado na seleção dos mesmos.


2. Nenhuma mulher fazia parte dos membros do júri, nem mesmo entre os suplentes. Seria naquela época vetado às mulheres participar como juradas nos tribunais dos Estados Unidos da América?


Pois nas mãos dessa "pérola" de júri se encontrava a vida de um rapaz de dezoito anos, o qual teria contra sua pessoa uma seqüência de evidências que o incriminariam segundo a ótica da maioria dos presentes da haver matado o próprio pai. Dentre as evidências apontadas por diferentes jurados, destaco:

a) "Não é segredo que crianças vindas da miséria são uma ameaça para a sociedade." A fala aqui transcrita argumenta que existe uma relação evidente entre origem humilde e criminalidade. Tal argumentação encontra eco em um segundo jurado, que acredita existir nas pessoas pobres uma propensão a cometer crimes. Diante de tais argumentações, ouve-se uma afirmação contundente: "O preconceito sempre obscurece a verdade."


b) A razão que teria provocado no rapaz tal ato de violência resultando em um crime, teria sido uma briga com seu pai, que o esbofeteara naquela noite. Para Davis, o personagem de Henry Fonda, é imprescindível lembrar que o acusado "nasceu na pobreza, sua mãe morrera quando ele tinha 9 anos, morou um ano e meio em um orfanato, enquanto o pai estava preso por estelionato". Davis argumentava que dezoito anos de sofrimento ininterrupto teriam praticamente "anestesiado" o acusado contra as agressões do seu pai e que aquele seria apenas mais um episódio de violência contra sua pessoa. Mas o próprio Davis conclui que, para a promotoria, este seria um argumento muito frágil em favor do acusado.


c) Uma terceira evidência foram os sons ouvidos por um vizinho, visto que alguém gritara "eu vou te matar" no apartamento acima ao dele. Davis argumenta que as paredes e o piso que separam os andares não permitem a distinção exata do que se escuta.

d) Para a promotoria, uma evidência inquestionável era a faca encontrada e que seria a arma do crime. Sabiam que o acusado tinha uma faca igual e que a mesma, argumentou-se, era rara, sendo improvável haver outra igual nas proximidades. Davis continua a desconstruir as argumentações da promotoria e dos demais jurados tirando de seu próprio bolso uma faca idêntica, relatando que a havia adquirido em uma loja local, na qual haveria outras disponíveis.


e) Ainda no campo das argumentações, a direção do corte no peito da vítima, de cima para baixo, não poderia ter sido desferida pelo acusado, em razão de sua estatura menor e do modelo de faca utilizado para o crime, que exigia uma empunhadura distinta.


f) Uma evidência dita inabalável era o testemunho de uma senhora. Esta afirmava ter visto o rapaz matando o pai a partir da janela de seu quarto, o qual ficava exatamente à janela do apartamento em que ocorrera o assassinato. Ela se encontrava dormindo. Acordara, aprumando-se em sua cama (à altura da janela) e vira a cena relatada. Contudo, Davis atenta que a mulher tinha o nariz marcado pelo uso de óculos, tal qual um dos jurados. Para ele, o fato dela precisar de óculos para corrigir sua falta de visão e, obviamente, não estar dormindo com os mesmos, rechaça seu testemunho. Sua argumentação baseia-se ainda no fato da presença desta testemunha sem os óculos durate seu depoimento, o que poderia ser fruto de uma instrução prévia da promotoria, que ocultara ser necessário à testemunha o uso de lentes para bem visualizar toda e qualquer situação em seu redor.

O ápice da obra é justamente quando o número de jurados em favor da condenação do rapaz se inverte, passando de onze para um. O último a resistir em mudar seu voto o faz, como fica claro, por estar magoado com seu próprio filho, também jovem, que desaparecera depois de dar-lhe (no pai) um murro no seu queixo durante um desentendimento entre os dois. Percebendo que estava usando o acusado do crime para julgar a atitude de seu filho, certamente para vingar-se em função da dor que sentia, muda seu voto nos minutos finais.

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