domingo, 24 de outubro de 2010

O aluno da EJA

EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO BRASIL
UNIDADE 2 - PARTE 3: Linguagem e pensamento


“Jovens e Adultos como sujeitos de conhecimento e aprendizagem”

Quem são os alunos da EJA? Longe de repetir estereótipos, depois de trabalhar com este aluno desde 2003, é possível afirmar que existe um padrão: os alunos que foram excluídos ou que, ao longo do tempo, não experimentaram motivação para continuar seus estudos. Enfim, são os alunos mais desfavorecidos em sua trajetória pessoal – financeira, cultural, psicológica e, via de regra, cognitivamente. São alunos adultos, por vezes empregados, por vezes em busca de colocação. São jovens, não raro com os mesmos conflitos da adolescência que os alunos de periferia e de classe baixa enfrentam nos outros turnos da escola. São idosos, que confessam ter na escola um local onde conhecem pessoas novas, interessantes, e aprendem o que não lhes parecia sequer existir. A EJA é constituída por uma gama tão plural de alunos que não podemos nos furtar de lembrar que são afro-descentes ou brancos, mas todos pobres. Podem ser egressos do sistema penitenciário, moradores de casas de passagem, envolvidos em delitos de toda sorte e em drogadição; sujeitos com transtornos psicológicos – depressão, bipolaridade, hiperatividade – ou convivendo diariamente com pessoas portadoras de tais doenças. São indivíduos com necessidades especiais, com expectativas estilhaçadas ou sonhos jamais permitidos. Enfim, tem-se uma gama tão vasta de alunos que pensá-los apenas pelo viés geracional seria um erro por demais grosseiro.

Kohl afirma que estes são os alunos “excluídos da escola”; eu acrescentaria que estes mesmos alunos são também excluídos na escola. Acredito que enquanto as demandas dos alunos e do projeto pedagógico seguirem caminhos antagônicos, a escola não estará a serviço daqueles que, afinal, são a razão de sua existência. Kohl assertivamente destaca que “se esses adultos não pensam de forma apropriada ou não são capazes de aprender adequadamente, isso se deve a sua pertinência a um grupo cultural específico.” É papel da escola e da EJA destacar este pertencimento, recrutando o conhecimento do aluno como partícipe no processo de ensino-aprendizagem. “(...) não há evidências de que algum grupo cultural tenha deficiências nos componentes básicos dos processos cognitivos. Isto é, todo ser humano é capaz de abstrair, categorizar, fazer inferências, utilizar formas de representação verbal etc.” Indispensável, portanto, ver cada aluno da EJA além dos processos escolares. Para estes indivíduos, o desempenho nas relações entre seus pares não raro determina posições de status dentro do grupo, as quais são por eles valorizadas, mas não pela escola. Para Kohl, “todo conhecimento é igualmente valioso, toda visão de mundo é legítima, todo conteúdo é importante.”

Mas e quanto ao professor: estará ele disposto a ouvir histórias de perdas, de violência de toda espécie e de incontáveis maneiras de desumanizar alguém? Em meio a tais relatos de dor e aridez ouve-se lampejos de esperança, pois passa pelo cabedal de aspirações deste aluno perceber-se parte da sociedade letrada, de forma que possa exercer sua cidadania integral e plenamente. De toda forma, isto não ocorre no primeiro dia, na primeira semana ou mês; despir-se de um sentimento de inadequação social começa pelo acolhimento cotidiano na práxis de sua escola. Isto é, encontrar um ambiente acolhedor e prazeroso representará a este aluno uma motivação ímpar para que se permaneça inabalável no propósito de dar prosseguimento aos estudos outrora interrompidos. Não de outra forma, a EJA auxiliará a reescrita das histórias de dos seus atores, posto que são estes mesmos sujeitos os criadores de uma nova trajetória pessoal individual e coletiva possível.

REFERÊNCIAS:

OLIVEIRA, Marta Kohl de. Jovens e adultos como sujeitos de conhecimento e aprendizagem. Revista Brasileira de Educação, Set./Out./Nove./Dez. 1999, n. 12, p. 59-73.

Um comentário:

Patrícia_Tutora PEAD disse...

Paulo muito boa sua postagem, adorei! Em seu texto traz teoria e argumentos, enriquecendo muito a postagem!

O que mais você diria ou apresentaria para sustentar sua argumentação?

Abraços