domingo, 27 de junho de 2010

Relação entre pais e professores


O início do estágio foi marcado, entre outros fatos - positivos - pela dificuldade de alguns pais em entender a proposta do trabalho do professor no que dizia respeito à publicação de imagens dos alunos durante atividades pedagógicas. Não deveria causar surpresa a negativa de cinco pais: em uma turma de 28 alunos apenas os pais de nove deles estiveram presentes a reunião de pais e mestres do início do ano, justamente quando o professor delineou sua metodologia de trabalho e esclareceu quaisquer dúvidas que surgissem.

Estas reuniões têm por objetivo, primeiramente, propiciar uma aproximação entre a escola e os responsáveis legais dos alunos. Por "aproximação" entenda-se compartilhar com os pais o projeto pedagógico da instituição, a metodologia de trabalho do professor, os papeis que cabem à família e à escola, entre outras demandas. Contudo, quando um receio que beira à histeria e se torna uma postura inconveniente sublinha as já pífias relações de porta*, manter a calma é um feito hercúleo.

Não é de hoje que se tem a impressão que estamos, pais e professores, em posições opostas, aparentemente como se estivéssemos disputando algo. A escola tem sofrido todo o tipo de tentativa de intimidação e seus professores, a vitrine, não raro ouvem o que não merecem de pessoas que perderam o tom no trato com os educadores. Assim, em uma oportunidade na qual se discutiria o processo de ensino-aprendizagem, empreende-se um esforço para determinar insatisfações e ameaças de processos, enquanto alguns professores abandonam anos e anos de carreira no magistério.

Recentemente passei a esperar menos dos pais. É lamentável, pois a educação perde bastante quando não se firma uma parceria com aqueles que passam a maior parte do tempo com nossos alunos e, em última análise, aqueles que os educam. Contudo, a empáfia com que muitos destes pais se dirigem aos professores e funcionários e não raro encorajados com a anuência das mantenedoras das escolas faz-me recordar que sou um educador, não alguém que ali está para servir de alvo para a frustração alheia, saldo de tantos sonhos mal planejados e uma significativa parcela de vida sem qualquer compromisso senão o de tirar vantagem de alguma situação. 

A reunião de pais e mestres, que visa a coletividade e, igualmente, abre espaço para questões pontuais de cada educando, transformou-se em algo que o pai vai quando pode, a mãe aparece se é possível e o filho que sobreviva, de preferência sem terapia, porque o SUS tem um serviço execrável. 

Que excelente oportunidade de conhecer o filho pela ótica daquele que o instiga à pesquisa e à superação de seus limites. Porém, quantas "recomendações" de especialistas em educação quando ao que pode e o que não pode ser dito em uma reunião, ainda que em particular, obviamente. É tanto cuidado para não melindrar que se esquece do principal: as necessidades de nossas crianças. Recentemente, uma colega observara todos os indícios de depressão em um de seus alunos, mas calara em função do conselho de uma orientadora, a qual julgara "perigoso" conjecturar a respeito com os pais. "E se eles te processam por isso?" Juro que fiquei pasmo!

Indiscutivelmente, a postura de uma criança nem sempre se repete em casa e na escola. Imagine o quanto pais e educadores poderiam ganhar ao conversar, sem resistência e ameaças, a tal respeito? Ao reconhecer no filho depressão, agressividade, alterações bruscas e sistemáticas de humor, entre outras questões, quanto os pais estariam ajudando em sua educação, autoestima, segurança, etc. Mas se o professor é aconselhado a não tocar no assunto, então sigamos dizendo que "o fulano está bem" ou "ela precisa se concentrar mais", sem ter exata noção do que estas falas significam.

Pais seguem acreditando que a escola não cumpre seu papel e, surpresa pais, nós pensamos o mesmo a seu respeito. Não seria o momento então de baixar a guarda e, sem medo de soar piegas, dar as mãos em prol de uma educação integral e comprometida? Afinal, o que cada parte neste processo está a temer? O que não queremos, pais e professores, deixar vir à tona? O que esquecemos ao longo destes anos de abertura dos portões das escolas aos pais? É urgente a necessidade de sentarmos todos, de preferência bem próximos e em círculo, para acordarmos um ano de trégua, renovável por mais tanto tempo quanto pareça necessário.

Em tempo: ao final de uma reunião de pais e mestres para entrega de pareceres, ouvi de alguns daqueles cinco pais que negaram aos filhos aparecer nas fotografias e vídeos publicados no pbworks do estágio que gostariam que eu colocasse, agora, as imagens. Motivo: viram a conclusão do trabalho e disseram estar "encantados com o que foi feito." Apesar de eu haver experimentado alguma satisfação com esta mudança de decisão, não alterei de modo algum as páginas já publicadas anteriormente. Tal pedido veio dos mesmos pais que dias atrás lideraram uma espécie de movimento pelo "professor, fique", quando o período de estágio acabara. Em uma próxima oportunidade, e realmente espero que outro professor queira fazer um trabalho de inclusão digital - e usando seus próprios recursos - que estes mesmos pais venham às reuniões, ouçam o professor, perguntem, tirem dúvidas, contribuam e tomem a decisão acertada... antes do trabalho findar.

 

* relações de porta: é como classifico a disposição dos pais que nunca podem estar presentes em uma reunião da escola, mas aparecem sem aviso, por alguns minutos, na porta da sala, nos momentos mais inadequados e geralmente para fazer reclamações, ignorando mesmo quando o professor destaca um horário semanal para atendimento. 



domingo, 20 de junho de 2010

Afetividade em Vigotsky

Para Descartes, existimos ao passo que pensamos. E é só! Não há qualquer menção ao sentir, qualquer sinal de relevância ao interagir. De fato, pela ótica cartesiana, o ser humano é apenas racionalidade, predominando durante séculos uma dissociação entre razão e emoção. Para Platão, a natureza humana é racional. “Agir moralmente é agir racionalmente, e agir racionalmente é filosofar, e filosofar é suprimir os sentidos, morrer aos sentidos, ao corpo, ao mundo, para o espírito, o inteligível, a idéia. (Padovani e Castagnola, 1990, p. 119). Encontramos semelhante dissociação em Kant, para quem as paixões são as enfermidades da alma.

 

Ao encontrarmos Vigotsky, percebemos o caráter indissociável entre aprendizagem e a interação com o outro. Poderíamos afirmar que, ao contrário de Descartes, para Vigotsky, somos porque interagimos. De acordo com a perspectiva sociointeracionista, aprendizagem é um fenômeno possível através da interação entre indivíduos.

 

Vigotsky opõe-se às teoristas dualistas, as quais separam, por exemplo, mente e corpo, razão e sentimento. Para Vygotsky, a compreensão do pensamento humano só é possível quando se considera sua base afetivo-volitiva, uma vez que as dimensões do afeto e da cognição estão desde cedo relacionadas íntima e dialeticamente. Por sua vez, a vida emocional está conectada a outros processos psicológicos e ao desenvolvimento da consciência de um modo geral. (Oliveira e Rego, 2003)

 

Em Vigotsky, a razão não é castradora do sentimento, das emoções. Pelo contrário, a racionalidade está a serviço de uma vida mais madura, mais afetiva, posto que a primeira controlaria nossos impulsos mais primitivos, conferindo refinamento ao sentir. Como para o autor os sentimentos estão ligados aos significados construídos dentro de um contexto social, nossos modos de pensar e de sentir estão carregados de conceitos sócio-culturais. Deste modo, o homem aprende a pensar, falar, sentir e agir de acordo com a cultura na qual está inserido. Um ocidental pensa e sente diferente de um oriental ou de um mulçumano. O conceito de fidelidade e de ciúme, por exemplo, é diferente de acordo com a cultura. Do mesmo modo, o medo da morte está relacionado à crença na vida depois da morte ou à reencarnação... (Oliveira e Rego, 2003).

 

Ao estudarmos o comportamento humano e sua psique, devemos atentar para quatro pontos, de acordo com Oliveira e Rego: a história da espécie, do indivíduo, do grupo cultural e dos processos psicológicos desta pessoa. O sujeito é o resultado da dimensão cognitiva e afetiva que ele próprio concebe de si mesmo. A forma como responde ao mundo, interagindo com os outros, está diretamente ligada a abordagem que ele construiu enquanto membro de sua espécie.

 

Quem separou desde o início o pensamento do afeto fechou definitivamente para si mesmo o caminho para a explicação das causas do próprio pensamento, porque a análise determinista do pensamento pressupõe necessariamente a revelação dos motivos, necessidades, interesses, motivações e tendências motrizes do pensamento, que lhe orientam o movimento nesse ou naquele aspecto. (Vigotski, 2001, p. 15-16)


REFERÊNCIAS

Arantes VA. Afetividade e cognição: rompendo a dicotomia na educação. In: Oliveira MK, Rego T, organizadores. Psicologia, educação e as temáticas da vida contemporânea. São Paulo(SP): Moderna; 2002.

OLIVEIRA, Marta Kohl; REGO, Teresa Cristina. Vygotsky e as complexas relações entre cognição e afeto. In: ARANTES, Valéria Amorim (org). Afetividade na escola. São Paulo: Summus, 2003.

PADOVANI, Umberto; CASTAGNOLA, Luís. História da Filosofia. 15ª ed. São Paulo: Melhoramentos,1990.

VIGOTSKI, Lev Semenovich. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

domingo, 13 de junho de 2010

Relação professor-aluno


O que pode ser mais importante na formação de um indivíduo do que as relações humanas? Um olhar sobre as relações entre os alunos e seu professor envolverá, necessariamente, atenção às intenções e interesses de cada um, sem esquecer dos valores que movem cada ser humano.

Segundo GADOTTI (1999: 2), o educador para pôr em prática o diálogo, não deve colocar-se na posição de detentor do saber, deve antes, colocar-se na posição de quem não sabe tudo, reconhecendo que mesmo um analfabeto é portador do conhecimento mais importante: o da vida. Deste modo, nesta troca cotidiana com os educandos, penso ser indispensável que a mesma aconteça a partir de uma abordagem sincera, de quem se importa com seus possíveis futuros e que procura tornar o momento presente uma razão para pensar na Escola como um lugar no qual se é feliz. Acredito que nosso maior legado a deixar para uma criança seja o encantamento pelo aprendizado. Que presente seria mais belo do que semear o gosto pela pesquisa e cultivar uma postura curiosa em cada uma das mentes que passam conosco cerca de quatro horas diárias?

ABREU & MASETTO (1990: 115), afirma que “é o modo de agir do professor em sala de aula, mais do que suas características de personalidade que colabora para uma adequada aprendizagem dos alunos; fundamenta-se numa determinada concepção do papel do professor, que por sua vez reflete valores e padrões da sociedade”. Portanto, iniciar a aula com uma leitura para reflexão, utilizar somente cds, dvds e softwares originais, zelar pelo próprio material assim como os recursos de uso comum, sem esquecer de honrar os compromissos firmados (como ter sempre em mãos os materiais necessários para desenvolver o que fora planejado), são apenas alguns exemplos de facetas de nosso comportamento ais quais poderão os alunos utilizar como espelho. Todos deixaremos nossas marcas em nossos alunos, sejam estas positivas ou não. Sendo assim, que nossa opção seja por impingir-lhes o que há de melhor em nós. A esse respeito podemos atentar para as palavras de Freire:

"...o professor autoritário, o professor licencioso, o professor competente, sério, o professor incompetente, irresponsável, o professor amoroso da vida e das gentes, o professor mal-amado, sempre com raiva do mundo e das pessoas, frio, burocrático, racionalista, nenhum deles passa pelos alunos sem deixar sua marca” (2006).

Assim, afirmo que a relação entre educador e educando está balisada por nuances, tais como o tom de voz, o olhar, os sorrisos, o semblante tranquilo, o toque, ... enfim, a relação de empatia que se estabelece em sala de aula cotidianamente. O interesse pelos estudos não costuma estar entre os itens trazidos pelos alunos para a escola. Mas um professor motivado e motivador, que trabalha o que há de melhor em cada criança, ainda que não feche os olhos para o que deve ser melhorado, este será, com grande possibilidade de atingir uma quase totalidade do grupo, um elo entre alunos e conhecimento, de forma que as infinitas possibilidades que se descortinam diariamente a nossa frente não sigam ignoradas por aqueles que se julgam fadados a uma vida sem muitas opções.

domingo, 6 de junho de 2010

Utilização de computador





Imagem do software Os caça-Pistas, da empresa Soft Market.


Particularmente, aprecio a utilização de softwares pedagógicos em sala de aula. Acredito que tanto o aluno quanto o professor percebem que o computador, quando utilizado a partir de um planejamento claro, agrega valor ao processo de ensino-aprendizagem.


Experiências bem sucedidas tão conta de que a utilização de computadores pode reverter processos de repetência e até de evasão escolar, como na cidade de Piraí, no estado do Rio de Janeiro. Uma das 100 piores escolas do País recebeu da Intel um laptop para cada um de seus 400 alunos. Apenas um ano depois, a mesma escola viu seu conceito no IDEB simplesmente dobrar, assim como despencou o índice de evasão escolar de 10% para míseros 1%.


Em contrapartida, o professor Valdemar Seltzer, Prof. Titular do Depto. de Ciência da Computação do Instituto de Matemática e Estatística da USP, é terminantemente contra a utilização do computador com crianças e adolescentes não somente na escola, mas no seu cotidiano em família. Às pessoas que apregoam que o computador está presente no nosso dia a dia e, portal razão, devem aprender a usá-lo, ele lembra que o automóvel igualmente faz parte de nossas vidas e que nem por isso as pessoas cogitam que uma criança de sete anos deva aprender a dirigir. O professor não hesita em fazer projeções acerca do resultado da utilização de computadores a longo prazo, afirmando:


"Um dos piores efeitos que o computador no ensino poderá causar na mentalidade das pessoas é o desaparecimento da intuição de que os seres humanos são essencialmente diferentes das máquinas – e, de um pondo de vista global, infinitamente superiores a estas. Em conseqüência, os adultos do futuro, educados com computadores (mesmo sendo pouco o contato com essas máquinas), poderão chegar a pensar, por exemplo, que é mais do que natural delegar a um computador a tomada de decisões individuais e sociais. Afinal de contas, os computadores são muito mais rápidos e não cometem erros..."


Na mesma linha do professor Seltzer, as escolas Waldorf também abrem mão da utilização de computadores e demais tecnologias "com tela" em favor de uma pedagogia com recursos criados em sala de aula. Como nas escolas que utilizam a pedagogia Waldorf não é permitido utilizar na sala de aula o computador antes do ensino médio, procurei aprofundar-me um pouco mais na pedagogia waldorf, encontrando o que segue:

"... cultiva-se o querer (agir) através da atividade corpórea dos alunos em praticamente quase todas as aulas; o sentir é incentivado por meio de abordagem artística constante em todas as matérias, além de atividades artísticas e artesanais, específicas para cada idade; o pensar vai sendo cultivado paulatinamente desde a imaginação dos contos, lendas e mitos no início da escolaridade, até o pensar abstrato rigorosamente científico no ensino médio. O fato de não se exigir ou cultivar um pensar abstrato, intelectual, muito cedo é uma das características marcantes da pedagogia Waldorf em relação a outros métodos de ensino."


São argumentos bastante contundentes e particularmente acredito que todos estejam ancorados em evidências que os sustentem. Contudo, minha opção por utilizar o computador em sala deaula está atrelada a uma possibilidade de maior compreensão das temáticas planejadas, posto que a utilização de recursos adequados pode despertar maior interesse por parte dos alunos. Mas o recurso por si só nada muda em uma prática. Para que a mudança ocorra, faz-se necessário mais do que equipamentos; são indispensáveis humanos pensantes, motivados e responsáveis. E se porventura eu encontrar aquele ou aquela colega que insistem em não lançar mão de tecnologias digitais em sua práxis, serei eu o primeiro a lembrar-lhes que o advento de uma tecnologia não invalida tudo o que foi e continua sendo feito sem sua utilização.
Referências:

Pedagogia Waldorf. Disponível em http://www.sab.org.br/pedag-wal/pedag.htm Acesso em 06 de junho de 2010.

Os meios eletrônicos e a educação. Disponível em http://www.ime.usp.br/~vwsetzer/meios-eletr.html Acesso em 06 de junho de 2010.